quinta-feira

Sétimo


Saturday - September, 14th

  Por todo esse tempo, sempre tentei encontrar uma saída melhor que essa. Sempre esperei que alguma solução aparecesse e resolvesse tudo o que passamos. Só que a única que eu conseguia imaginar, não podia voltar para resolver a situação. Ou seja, a única coisa que me restou, é fazer o caminho oposto e ir ao encontro dela. Ela só é boa para mim, eu sei. Sei que é horrivelmente errado, que isso nunca deveria ter passado na minha cabeça, ter se firmado nela, ter criado raízes e se alimentado, crescido. Me desculpe.
  E, mesmo que ele, Bill, tenha me pedido para não me sentir culpado, que aquilo não era resultado de um ato também meu, eu nunca levei aquilo completamente a sério, como deveria ter levado desde o início. Se fosse, talvez não estivesse assim, hoje. Só que nem sempre acertamos nas nossas escolhas, e foi um erro que o levou a morte. Um erro que eu nunca pude me redimir, que tomei como meu, tendo a maior certeza de que não era (totalmente). Viu? Nem a mim mesmo dá para enganar.
  Me desculpe, novamente, por tudo. Por qualquer lembrança ruim. Por qualquer problema que eu tenha lhe dado quando estava vivendo feito um fantasma em casa, burro, recusando qualquer ajuda que fosse. Teimosia sempre foi algo forte na nossa personalidade, não é mesmo? E que ficou ainda pior quando o nós tornou-se apenas eu.
  Espero que todas essas lembranças tenham te mostrado que não vale à pena. Que não tem mais sentido. Que não vejo razão nenhuma em continuar. Só te peço, de novo, desculpas.
  Essa foi minha escolha, e você sabe como sou persistente nelas.
  Não queria te deixar com toda a dor com que fui deixado, mas agora vejo que esta será em dobro. Saiba que te amo, da mesma forma que Bill te amava.

  Invisível.
  É assim que eu queria estar. Para não ter que me lembrar de ninguém, trazer preocupações a menos pessoas ainda, e dar menos satisfações do que tenho que dar hoje. É só você ficar depressivo e de um minuto ao outro se tornar filho único que a sua mãe volta a te tratar como se você tivesse apenas 12 anos e estivesse começando a sair.
  Está tudo muito exagerado. Até eu. Exagerado e sem esperanças. Eu sei daquele ditado, mas cansei de acreditar nas minhas. No fundo, eu sei que elas só vão me levar à mais algumas decepções, e daí eu não irei aguentar.
  Portanto, posso deixar de aguentar desde agora.
  Como devia ter feito há sete meses atrás.


     Pois, se assim tivesse sido, eu não estaria aqui fazendo um papel de fantasma.

     Sim. Me sinto como um fantasma, nesse tempo todo. Um ser errante, que não tem mais o que fazer aqui, mas mesmo assim não consegue achar o caminho para a paz. Nem lágrimas, nem lamúrias, nem memórias. O mais longe que é capaz de ir é ao cemitério, porém, isso não lhe dá o que quer. E ainda assim, é o mais próximo que se pode chegar. Um fantasma movido a sofrimentos.

     Até me sinto idiota, pensando assim. Só que eu não sei mais o que fazer! Não sei se estou no mundo real, não sei se estou vivo, não sei o que ainda tenho que fazer. Nada faz sentido. Nada funciona como funcionava. Nada, do tudo que antes parecia ser.

     Tudo. Palavrinha abrangente. Tudo, para mim, é apenas uma coisa. Uma única coisa que mudava qualquer outra na minha volta, fazendo-as serem muito mais e muito mais diferentes do que a realidade mostrava. Aí sim eu podia dizer que o mundo era maravilhoso.

     Então, a catástrofe acontece, e carrega todo meu mundo embora, como se fosse numa enchente, uma enxurrada de socos; deixando-me a mercê de falsas esperanças. E como sou humano, fui burro o suficiente para acreditar nelas. E chegou o dia em que elas se esgotaram: ontem. Quando percebi toda a droga que estava minha vida. Se é que alguém chamaria isso de vida. Viu, aqui estão as esperanças de novo. Ou quase.

     Nem dessa nem em alguma outra, vou me deixar levar por elas. Não mais. Já chegou a hora de parar com tudo. De parar de sofrer, de chorar, de me lamentar. De lembrar. Chegou a hora em que o ponto final encontra seu lugar.


     Cansei dessa vida de fantasma. Em que parece que eu faço, quando na verdade fico sempre no quase, no acho, no pensei. E a situação variou, bastante. O que não mudou coisa nenhuma foi essa perspectiva. Teimosa demais, ela. Eu não quis ajuda de ninguém, não quis me deixar curar. As esperanças não me permitiram isso. Sobrou para mim e para a minha burrice, um espaço vazio. Ermo. Sem vida. Só nas ideias.

     Claro, se tudo fosse fácil como num sonho, eu teria acordado nele. Mas meus sonhos só me faziam me perder ainda mais, sabe-se lá para onde ou quem. Fantasma. Estava quase branco feito um. Não pegava sol. Só que, por mais branco que eu seja, ainda sou visível. Já, se eu fosse invisível... tudo se tornaria tão mais simples. Tão mais real, e menos estranho. Até mais prático.

     Um fantasma de verdade. Se é que isso existe.

     Para mim, existe. Eu apenas não posso vê-los.

     Sorri, conforme essa frase ia entrando em minha cabeça.


     A coragem que antes me faltava, agora estava exposta para quem quisesse ver. Opções de usá-la, eu tinha muitas, estava somente esperando o momento certo para mostrar minha escolha. E por você Bill, eu sei que ela está certa. Não se engane achando que ficou de lado durante algum tempo, irmão. Isso nunca aconteceu. Meu objetivo é o mesmo, desde que eu o descobri, e ele sempre envolveu você. Como poderia ser, ser você não existisse? Não poderia, simplesmente não é.


     Se eu sofri, foi porque eu tive que sofrer. Não porque eu quis.


  E é assim que tudo termina. Eu motivado por meu irmão, e carregado pela coragem. Tenho desculpas a pedir, mas não más memórias para carregar. E me desculpe por toda a minha sinceridade, se nesse momento, o que mais me importa é ele, mãe.

  Adeus. Tom.

Epilogue – E eu não me arrependo.

* * *

     Menos de uma semana depois, o cemitério já comportava um novo morador. Este descansava ao lado do irmão, onde, em uma lápide semelhante a dele, estava escrito:

  Tom Kaulitz
  1/9/1989 – 14/9/2008
  O melhor irmão do mundo.

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